terça-feira, 18 de março de 2014

Não querendo, então queria Kleist

     
      Se o nevoeiro abafa os sons, o mármore do senado amplifica-os. Não há nada como a noite para lhes dar corpo, com sombra e alma. Coincidência (ou não), são  passados 3 dias dos Idos de Março que ficaram na história dos homens e nas várias memórias deles. 23 facadas e 60 senadores depois, eis-me nem césar nem romano.
      Distraído, limpo as mãos da tinta vermelha (Rouge Garance). Talvez embriagado pela terebentina, ausento-me, os olhos e a cabeça esgotados, devoram-me memórias, anestesiam-me dores... Acorda-me a dor causada pela fúria com que esfrego as mãos, como se quisesse arrancar pele e, com ela, alguma espécie de culpa. Não a culpa com que nascemos, não aquela com que explicamos a aridez estéril dos dias, nem o plástico de que são feitos os sonhos que sonhamos; não a com que tentamos compreender a doença, nem a que nos ajuda a viver connosco próprios. Muito menos a que nos envenena, quando nos cruzamos com a Morte, porque para essa não arranjamos destinatário.
      (continua)