segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Não nos merecemos (mais)


Olhos secos são sal e pó
Neste quarto deserto
Habitado apenas de ti e eu calado.

O teu olhar duro sabe que
Os meus lábios calarão
Memórias, lágrimas, leite.

Eu e tu, um citadino luar
E silêncio, um lago de silêncio...
Eu a não querer estar aqui
Entre o que sei e o que recusas esquecer.

Sei-te frágil a socar, cega, o ar
Sobretudo temo a brilhante navalha
O afiado aço do teu desprezo, mas
Mas nem tu desconfias desse poder imenso.

O mundo cansou-se de nós.
Tu insistes. Eu desisto, apenas por saber
Que a morte há-de entrar pela porta como a avó.
Por isso, resignado, me sento na velha poltrona.

Como se pela memória pudesse
Resgatar os meus mortos, salvar-te ou dizer que te amo.
Do copo partido no chão, sobram cacos e corpos
de uma vida que durou demais.

É tão raparigo o teu medo, menina
E eu pai canalha de nada. E de nada
Se enche o quarto que é já mundo.
Ouve (se ainda puderes): Se enche e não esvazia.