domingo, 26 de dezembro de 2010

EXCESSOS DE LINGUAGEM




Ainda que desperte de novo a Banca
e a Indústria se reerga do escombro,
jamais esta prosódia crua e franca
enfeitará com renda o desassombro.
Façam da pronúncia obra de arte,
apertem o paradigma do decoro,
elevem a polidez a estandarte,
redefinam o conceito ao desaforo,
mas a cauta e sábia ronha popular
terá na imprecção e no impropério
remédio eficaz para a falta de ar.
Até a dama chique sai do sério,
desce do vison e arreia a giga,
se lhe dão mostarda a cheirar.
A própria semântica que diga
se o sangue do vocábulo fino e acetinado
não é o mesmo do vocabulário rude e malcriado.
Perguntem aos peritos da linguística
se a figura interjectiva então carago?
não espevita a mais morcona narrativa.
Que se arrepiem os cultores da estilística,
mas nada como um foda-se! bem enfático
para culminar um bom pico dramático.

    Carlos Tê, in "Cimo de Vila" (Afrontamento, 2010)

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