sábado, 11 de dezembro de 2010

Os mundos que as voltas dão (1)

Há um ror de anos (20? 30?), numa livraria da Imprensa Nacional, o meu olhar guiou-me as mãos para um livro. Só quem já esteve numa dessas livrarias entende o que quero dizer.
Gostei do título ("Da Cegueira dos Pintores"), atraía-me o autor (Júlio Pomar), interessava-me o assunto (a pintura).
Lembro-me do dia (e do sol de primavera e do frio), lembro-me da rua, e nunca me perdoei o juizo que tive (... era muito novo) ao não esvaziar, literalmente, os bolsos e salvá-lo (a ele livro) daquela aridez de monos e bafio erudito. E, quem sabe, não me ter salvo (a mim) ...
Depois, nunca mais o vi. Descruzámo-nos numa espécie de namoro, de longo e anarónico noivado, Eu sei (vagamente) por onde andei; e o que não me lembro invento (o que é outra forma de saber). A ele não lhe pergunto, mas gosto de imaginar que ficou à minha espera. Sei é que ficou em mim numa espécie de existência adormecida, enrolada num cobertor de aparente esquecimento...
Passados tantos anos, do nada (?), revi o nosso encontro... ou sonhei com ele, já não sei e não importa. Dispus-me a atravessar oceanos ou desertos para o encontar. Por uma espécie de ironia (quase infantil) tinha desaparecido... Não havia registos nem ninguém tinha ouvido falar dele. Talvez esse jogo das escondidas tenha transformado a  vontade em necessidade.
Por fim, dei com ele numa biblioteca escondido no nome do tradutor e não do autor. Por não querer falar de emoções não vos conto como o trouxe colado a mim, sem o abrir, nem a pressa com que galgei avenidas e passantes. Quando, finalmente, o tive solenemente para mim, ainda me estava reservado um contratempo: aquele não era "bem o "meu" livro. Por todas as páginas se entrepunham entre nós sublinhados toscos, sinais de outra leitura, cheiro de outro leitor, outro livro, em suma. De safa na mão, tudo removi. Até ficarmos ele e eu e um ror de anos (20?30?).
E mais não digo, a não ser que afinal há salvação (ou salvações que por serem mais do mesmo devem ficar no singular).

... isto foi o que se passou  com um livro que é uma voz que é uma pessoa.

Por saber a diferença entre a solidão da magia e o espectáculo do ilusionismo, também sei que estas coisas não são partilháveis. Ainda assim aqui deixo o livro:

https://docs.google.com/leaf?id=0B4AGe0kYCYitZGNhYjNhYmItYjA1OS00NGNmLTljZGQtZTcyZTE4OTJmNjNj&hl=en

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Premonição

Quando a boca amarga e o estômago arde
E na boca o cigarro é o beijo que nos resta,

Quando o silêncio nos corrói
e uma improvável gaivota não nos deixa esquecer

Sabemos que lá fora o escuro
é só um dia de sol apagado
e há-de nascer uma noite
de luz e gente e morte

pesadelos (noites brancas, tardes quentes)

                                                       Jules Gervais-Courtellemont - Durmiendo la siesta em Sevilla



Dorme vestido
Para não (ver/saber)es
O que se te colou
à pele



sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Vagamente Woolf

"Nada existe, até ser contado"