terça-feira, 26 de janeiro de 2010
Susan Sontag - Imaginação Pornográfica (excerto final)
Em última análise, o lugar que atribuímos à pornografia depende dos propósitos que estabelecemos para nossa própria consciência, para nossa própria experiência. Mas o objetivo que A adota para sua consciência pode não ser aquele que ele aprecie ver B advogar, desde que julga que B não é suficientemente qualificado, experiente, ou sutil. E B pode ficar consternado ou mesmo enraivecido pelo fato de A adotar propósitos que ele próprio professa; quando A os sustenta, eles se tornam presunçosos ou banais. É provável que essa crônica desconfiança mútua das capacidades de nossos próximos (que sugere, com efeito, uma hierarquia de competência com relação à consciência humana) jamais se resolva de forma para todos satisfatória. Na medida em que a qualidade da consciência humana varia tão amplamente, coma haveria de ser diferente? Num ensaio que escreveu sobre o tema alguns anos atrás, Paul Goodman afirmou: “A questão não é saber se se trata de pornografia, mas a qualidade da pornografia”. Isso é correto e seria possível estender bastante mais o pensamento. A questão não é saber se se trata de consciência ou de conhecimento, mas a qualidade da consciência e do conhecimento. E isso exige considerar a qualidade ou agudeza do problema do homem – o modelo mais problemático de todos. Não parece incorreto dizer que, nesta sociedade, a maioria das pessoas que não é louca ativa, é, na melhor das hipóteses, lunática corrigida, ou potencial. Contudo é possível supor que alguém aja de acordo com esse conhecimento, ou conviva genuinamente com ele? Se há tantos que oscilam à beira do assassinato, da desumanização, da deformidade e do desespero sexuais, e se devêssemos agir de acordo com esse pensamento, então uma censura que jamais imaginaram os inimigos indignados da pornografia pareceria adequada. Se é esse o caso, não somente a pornografia mas todas as formas de arte e conhecimento autênticas – em outras palavras, todas as formas de verdade – são suspeitas e perigosas.
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